terça-feira, 12 de março de 2019

Quando Mané era criança sua mãe costurava para fora, no sentido estrito da palavra. Moravam num pequeno apartamento na Av Rio Branco e as clientes vinham fazer a prova das roupas, atividade que acontecia na sala que, na verdade, era onde tudo acontecia por ali. Pelo meio da tarde, enquanto Mané fazia lição de casa, as clientes chegavam e ficavam tagarelando e tirando a roupa quando isso era necessário. Se havia a necessidade de algum ajuste rápido, elas ficavam por ali de soutien e calcinha, circulando desinibidas e não eram poucas as que se aproximavam de Mané, naquela indumentária, auxiliavam-no em alguma dúvida e depois voltavam para a frente do espelho. Ninguém dava conta de Mané, que era criança, sim, mas nem tanto. As moças deviam ter em torno de 30/35 anos e eram, na visão do garoto, todas belas e exuberantes. Mané quieto no seu canto, espichava o olho a perscrutar os recônditos das clientes de sua mãe e depois gastava muito tempo contando os detalhes para seus amiguinhos da rua, entre um e outro raide em carrinhos de rolimã. Certo dia, Mané estava à espreita, aguardando a Dona Leonor, umas de suas favoritas, que vinha experimentar um vestido. Ela apareceu e quando tirou a roupa Mané viu de olhos esbugalhados, que ela estava de cinta liga e meias de nylon, daquelas que antigamente tinham um risco na parte de trás. E foi um festival de tira e põe o vestido e Mané estava em brasas na sua cadeira quando na hora da prova final Dona Leonor se contorce para deixar o risco da meia bem reto e pergunta pra mãe de Mané se estava retinho mesmo e a mãe de Mané já enfastiada lhe diz que sim e Mané, num dos maiores vacilos de sua vida grita: “não está reto não, ali, bem pertinho da bunda, ainda está meio torto”, e correu até a bunda de Dona Leonor e atabalhoado tentou, com os dedinhos, acertar o risco. Foi um desastre, Mané nunca mais pôde assistir às provas de roupa, as corridas com carrinho de rolimã também perderam o encanto e Mané se deu conta de que tinha crescido. 27/02/2019

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