sábado, 11 de abril de 2020

Mané tem dois sobrinhos gêmeos: Halim e Faruk que já são velhinhos, 45 anos em dezembro. Desde que nasceram Mané sempre achou que eles, assim como Samira, 32 em outubro e Anuar, 26 em maio, pertenciam a uma geração de privilegiados, que viveram, nos limites da sua bolha, tempos de paz e prosperidade. Mané, 65 em novembro também não tem do que reclamar. As dificuldades pelas quais passou sua família não o atingiram diretamente, Aslan, 98 se vivo e Sara, 86 em julho, cuidaram para que as mazelas não atingissem os filhos ou pelo menos que os atingissem de forma atenuada, mas, enfim, do período pós-guerra até hoje, não houve deslocamento emigratório, fome, blackouts ou qualquer outra mazela pelas quais passaram nossos pais e avós. Por isso Mané se preocupou, no início da pandemia sobre como ia reagir essa geração de ouro, cheia de vontades e de mimos, de repente privada, no mínimo, de sua liberdade. Halim escreveu um texto, se ele quiser pode publicá-lo aqui, que denota o seu estupor diante da situação. Mané leu, achou interessante, mas não achou impactante {o que deixou o menino mimado meio bravo, vale dizer que Halim tem skills em outas áreas que não a literatura} apesar de que o texto o fez pensar no assunto e chegar à conclusão que essa novidade que nos atingiu não afeta somente a geração que viveu muito bem até aqui, o que é estranho. Falando com sua mãe isolada, Mané percebe que Sara que passou por perrengues quando criança durante a segunda guerra, que teve a família expulsa do Egito aos 22 anos com 2 filhos pequenos, que batalhou para criar uma vida num país distante e estranho, está completamente estupefata com a situação atual. Mané e Salma, que passaram por uma infância pobre, os pais lutando para sobreviver, estão completamente estupefatos com a situação. Se há três semanas, alguém contasse essa história, Mané acharia que seria um excelente roteiro de cinema, “o ano em que a Terra parou”, mas já tem um filme com esse nome. Mas, sim, queridos Halim, Faruk, Salma e Anuar, vocês que agora estavam alçando vôo ou já em velocidade de cruzeiro, vão sentir mais o impacto, estamos vivendo a dificuldade e teremos mais dificuldades ainda adiante. O ser humano não cria anticorpos contra maus momentos, como vemos pela reação da mãe de Mané, mas a boa noticia é que ele se adapta a qualquer coisa e se não se adapta, morre. 11/04/2020

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