sábado, 25 de setembro de 2021

Aqui, vizinho de Mané, mora um casal de velhinhos. Mané descobriu que a mulher acaba de fazer 92 e seu companheiro vai em breve alcançar os 95. O homem tem sérios problemas para escutar e não enxerga bem. Demora para reconhecer Mané mas quando percebe quem é sempre tem uma palavra afetiva para entregar. Anda de bengala, tem um problema pequeno no coração e um pouco de diabetes. A mulher ainda está bem speedy. Fora uma artrite visível na mão, é uma senhora magrinha muito ativa. Sempre oferece uma bolachinha feita por ela mesma em troca de pequenas gentilezas que Mané faz e ainda oferece jantares uma ou duas vezes por mês para pessoas da sua pequena família, mesmo durante a pandemia. Podem ser vistos caminhando pela rua todo dia, param para conversar com os taxistas e com o barbeiro da esquina e cumprimentam todos que passam por eles na rua. Antes do corona paravam para um café na padaria, ele falando muito mais alto que o necessário com o garçom e ela rindo da surdez dele. Agora eles só acenam, às vezes sentam numa mesinha do lado de fora. Dia desses, quase no fim da caminhada, Mané deparou-se com a mulher descendo de um táxi a uns três quarteirões de casa e abordou-a mas quando ela o viu, reagiu constrangida. Mané perguntou se estava precisando de ajuda, o que ela fazia ali e porque descia do táxi tão longe do prédio. Ela olhou tristemente para Mané e respondeu que, “bem, já que você me flagrou, me ajuda a andar até em casa e eu vou te contar que três vezes por semana eu ponho o marido pra dormir e saio pra dar uma volta, comprar alguma coisinha espairecer. Não sei se você vai entender mas é difícil ficar 24 horas com um velho surdo dentro de casa. A faxineira fica com ele e se ele me chama ela diz que fui na vizinha”. Mané achou graça, riram juntos mas ela estava chateada de ter sido descoberta. Pediu segredo a Mané. Disse que o marido não podia saber das suas escapadas e agora, por causa da pandemia, se o filho soubesse disso, “acho que ele me mata”! Mané perguntou onde ela ia: “no mercado, dou uma volta no shopping mas, ó, eu tenho máscara, álcool, to vacinada fico longe das pessoas”. Chegando em casa ela o fez jurar que não contaria pra ninguém, “não ouse falar nem pra Salma, sabe como são as mulheres, they like to gossip”. Ah, Mané esqueceu de dizer que a mulher fala inglês fluente. Semana que vem ele vai lhe dar uma carona até o Bourbon. Ela pediu. 31/05/21

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