sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Quando trabalhava no banco Mané foi assíduo freqüentador da Ponte Aérea e um dia, na fila para o embarque do Rio para São Paulo, estava lá nos seus devaneios quando levou um encontrão. Olhou de soslaio e viu uma moça com uma maleta que parecia pesada. Ignorou o fato e de posse do cartão, seguiu para o embarque. Apenas tinha dado uns passos quando virou para trás e viu a mesma moça, que naquela hora lhe pareceu familiar, arrastando a tal maleta pelo saguão. Muita gente olhava para ela e para a dificuldade, mas ninguém fazia nada. Mané, muito cavalheiro foi em sua direção para ajudar e quando chegou perto percebeu de que se tratava de uma famosa da TV e paralisou. Hesitou em oferecer ajuda, achou que poderia pensar que era uma artimanha para se aproximar dela e aproveitar-se de sua fama para sei lá o quê! Estava lá parado quando ela, que tinha se acercado dele e pediu para ajudá-la. Mané demorou uns segundos para ter certeza que era com ele, achou-a mais feia que na TV, e petrificado, abaixou e pegou uma alça e assim, sem trocar palavra e como se fossem amigos, entraram na sala de embarque. Mané ficou com a impressão que todos olhavam quando colocou com um tremendo esforço a maleta sobre uma cadeira enquanto ela sentava e lhe pedia um cigarro. Mané disse que não fumava e ela disse tudo bem, que nem queria fumar de verdade e, conforme ia ficando mais bonita, perguntou se ele podia ajudá-la a levar a maleta para o avião e com um olhar que pareceu uma convocação, instou-o a sentar. Mané achou que todos no salão notaram quando sentou ao seu lado, como quem não quer nada, seus ombros a se tocar e entabularam uma conversa enquanto aguardavam a chamada para voar. Ela perguntou seu nome e o que fazia da vida e Mané foi respondendo de uma forma meio travada, quase burocrática. Ela contou que vivia na Ponte Aérea e ele alegremente disse que também, talvez um pouco menos do que ela, e achou que aquilo os colocava em igualdade de condições, o que o deixou mais à vontade e lhe deu coragem para perguntar qual era o seu nome e o que fazia, como se já não soubesse. Claro que depois, no avião, enquanto ela ressonava suavemente no assento ao lado, Mané se censurou por ter feito aquela e outras perguntas idiotas, enquanto tentava parecer natural. Ele não acredita ter conseguido, mas ela teve um comportamento exemplar e não deixou transparecer nenhum abalo pela estultice de Mané. Chegando a Congonhas, ajudou-a até a fila do taxi e depois de ter colocado a pesada maleta no banco traseiro, ela, antes de entrar no carro, lhe estalou um beijo na bochecha e agradeceu por tudo enquanto batia a porta. O segundo da fila certamente percebeu o rubor que lhe tomou a face. Mané ainda queria perguntar o que havia de tão pesado na maleta mas o táxi arrancou e aquela foi a última vez que a viu ao vivo.09/12/2020

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